quarta-feira, 12 de março de 2008

Crítica pelo crítico - Paulo Moreira Leite

Paulo Moreira Leite


Jornalista de renome, tendo já passado pelo Estado de São Paulo e Jornal da Tarde, Paulo Moreira Leite é o autor da crítica desta semana, propícia em épocas de eleições norte-americanas que, reflexamente, influenciarão nos nossos próximos anos.

Seu currículo informa que, além da atividade ativa como jornalista, foi correspondente em Paris e Washington da Revista Época, redator chefe da VEJA, direitor de redação do Estado de São Paulo e, durante fevereiro de 2007 e janeiro de 2008, ocupava o cargo de Vice-Presidente da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. Ufa!

Um breve resumo da crítica abaixo é que Obama é o que é pelo simples fato de ele ser. Para entender melhor o resumo, melhor ler o texto inteiro.



"Se Obama fosse branco..."



A questão racial voltou a campanha americana, mais uma vez pela boca dos adversários de Barack Obama. Quem tocou no assunto foi uma aliada de Hillary Clinton.

Diante da liderança de Obama, que ontem venceu as primárias do Mississipi, a veterana Geraldine Ferraro – no passado, ela teve uma canditadura presidencial destruída por problemas do marido com o Fisco – disse o seguinte: “Se Obama fosse branco, não estaria nessa situação. E se fosse mulher (de qualquer cor) ele não estaria nessa situação. Ele tem muita sorte de ser quem ele é.”

Filho de um professor africano e de uma professora de classe média branca, em sua formação Obama frequentou escolas da elite americana, onde chegou a ser um dos 3 negros num total de 1500 alunos brancos. Em campanha, sua estratégia para lidar com a questão racial foi estabelecida por sugestão do marqueteiro chefe, David Axelrod, antigo repórter político de Chicago. A idéia é tratar os Estados Unidos como uma sociedade pós-racial: o eleitor obviamente sabe que Obama é negro, ninguém nega a existência do racismo – mas ele não fala no assunto, não assume as bandeiras tradicionais do movimento de direitos civis nem define políticas especiais dirigidas a população negra. (Não há notícia de que tenha feito um único elogio direto às políticas de ação afirmativa nem ao sistema de cotas). Sua perspectiva é dirigir-se à nação. Faz propostas para a população em geral, defende a prioridade aos pobres. A opção lhe valeu críticas de lideranças negras tradicionais. O reverendo Jesse Jackson, pré-candidato presidencial por duas vezes com um desempenho sofrível, tem uma relação de amor-e-ódio com o candidato. Mas o fato é que os eleitores negros apoiam essa opção. Eles tem votado por Obama por larga margem na maioria dos Estados. O discurso também abriu as portas para Obama junto aos eleitores em geral e só por isso ele lidera a corrida entre os democratas. Quando levantam a cor de sua pele, seus adversários pretendem, é claro, despertar o racismo presente em boa parte dos eleitores.

Num país onde a população negra representa 15% do eleitorado, a postura de Obama impediu que sua campanha ficasse isolada como porta-voz de uma minoria. Mas eu acho que sua opção vai além da vantagem eleitoral. Acredito que a chamada perspectiva pós-racial representa a chance de se construir uma visão mais civilizada da política americana, pois separa o preconceito do debate sobre políticas públicas. Afinal, existem poucas coisas tão condenáveis e tão atrasadas como o racismo, não é mesmo?





Li no [Blog do PauloMoreiraLeite]

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