sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Crítica pelo crítico - Luis Fernando Veríssimo

"A produção não pára de crescer...


Veríssimo é inigualável.

Sua crítica é simples, singela e, ao mesmo tempo, incisiva e perturbadora. O texto abaixo reflete isso. Nada melhor, portanto, que escolhê-lo para estrear esta mais nova seção do blog, "Crítica pelo Crítico", em que críticos fazem o que sabem de melhor: falar sobre tudo e todos, das mais diversas formas. Ou seja, criticar.

Vale relembrar, aos incautos, que Veríssimo possui todo viés esquerdista-libertário, por isso essas suas palavras assumem uma feição tão crítica.






Uma modesta proposta




Brasil já fez reforma agrária — dos outros. Muitos dos imigrantes que vieram no século dezenove estavam, nos seus países, na mesma situação dos atuais sem-terra no Brasil. Eram os excedentes de uma estrutura fundiária perversa, sem uma estrutura industrial que os absorvesse. Itália, Alemanha, etc., fizeram a sua reforma com a nossa terra, mas não podemos esperar que nos devolvam o favor. Não existem outros brasis no mundo para receber os sem-terra, já que este está ocupado. Se houvesse, poderíamos incluí-los na nossa pauta de exportações. Depois dos ciclos do café etc., o ciclo dos desesperados. Só teríamos de cuidar para que este ciclo não repetisse os outros.



Fomos os maiores produtores de açúcar do mundo. Não somos mais. O que sobrou do ciclo do açúcar foram usineiros vivendo até hoje de subsídios mas não exportando açúcar. Já produzimos borracha como ninguém. Não produzimos mais. Depois veio o café. Abastecíamos o mundo inteiro de café, sem concorrência. Isso também acabou. Depois veio a bossa-nova. Dominamos o mercado mundial até os bateristas americanos aprenderem a batida. Hoje não precisam mais de nós. A lambada parecia que ia nos redimir. Os franceses a encamparam, depois a esqueceram. Hoje exportamos jogadores de futebol, modelos gaúchas e soja. Poderíamos exportar desesperados. A produção não pára de crescer.


Mas como não há mercado para eles, deveria-se pensar numa alternativa mais radical. Há uns trezentos anos o escritor Jonathan Swift sugeriu aos irlandeses que comessem seus bebês. Ajudaria a diminuir a fome e ao mesmo tempo resolveria o problema da superpopulação no país. No mesmo espírito, e já que a nossa estrutura fundiária não só não muda como partiu para o revide com cobertura da Justiça, no campo eles são supérfluos e na cidade eles não têm empregos e não há outra saída, os sem-terra deveriam ser convencidos a se suicidar. O suicídio coletivo seria um gesto patriótico que daria paz aos campos, sossego aos latifundiários e alívio ao governo. E, ainda por cima, um pedaço de terra para cada um.



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