quinta-feira, 4 de outubro de 2007

"Sinto-me envergonhado..." Será mesmo??


Eh, mais uma vez me deparo com novos cientistas criminais em segurança pública.


Dessa vez, o não menos televisivo, jovem milionário, marido de minha companheira de muitas tardes da extinta manchete, Luciano, O HUCK, deu seu veredicto final sobre a questão da criminalidade.


Vejam por vocês mesmos:


Carta de Luciano Huck
O apresentador Luciano Huck foi assaltado na quinta-feira, dia 27 de Setembro, em São Paulo. De arma na mão os ladrões levaram o relógio dele. Esse episódio de violência gerou uma carta indignada dele que saiu no jornal Folha de São Paulo:
Luciano Huck foi assassinado. Manchete do Jornal Nacional de ontem... E eu (Luciano), algumas páginas à frente no caderno policial. E, quem sabe, uma homenagem póstuma no caderno de cultura.
Não veria meu segundo filho. Deixaria órfã uma inocente criança. Uma jovem viúva. Uma família destroçada. Uma multidão bastante triste. Um governador envergonhado. Um presidente em silêncio.
Por quê? Por causa de um relógio. Como brasileiro, tenho até pena dos dois pobres coitados montados naquela moto com um par de capacetes velhos e um 38 bem carregado.
Provavelmente não tiveram infância e educação, muito menos oportunidades. O que não justifica ficar tentando matar as pessoas em plena luz do dia. O lugar deles é na cadeia.
Agora, como cidadão paulistano, fico revoltado. Juro que pago todos os meus impostos, uma fortuna. E, como resultado, depois do cafezinho, em vez de balas de caramelo, quase recebo balas de chumbo na testa.
Adoro São Paulo. É a minha cidade. Nasci aqui. As minhas raízes estão aqui. Mas a situação está ficando indefensável.
Passei um dia na cidade e três assaltos passaram por mim. Meu irmão, uma funcionária e eu. Foi-se um relógio que acabara de ganhar da minha esposa em comemoração ao meu aniversário.
Onde está a polícia? Onde está a "Elite da Tropa"? Quem sabe até a "Tropa de Elite"! Chamem o Comandante Nascimento! Está na hora de discutirmos segurança pública de verdade. Tenho
certeza de que esse tipo de assalto ao transeunte, ao motorista, não leva mais do que 30 dias para ser extinto. Dois ladrões a bordo de uma moto, com uma coleção de relógios e pertences alheios na mochila e um par de armas de fogo não se teletransportam para o infinito.
Passo o dia pensando em como deixar as pessoas mais felizes e como tentar fazer este país mais bacana. TV Diverte e a ONG que presido têm um trabalho sério e eficiente em sua missão. Meu prazer passa pelo bem-estar coletivo, não tenho dúvidas disso.
Confesso que já andei de carro blindado, mas aboli. Por filosofia. Concluí que não era isso que
queria para a minha cidade. Onde estão os projetos? Onde estão as políticas
públicas de segurança? Onde está a polícia? Quem compra as centenas de relógios
roubados? Onde vende? Não acredito que a polícia não saiba. Finge não saber. Alguém consegue explicar um assassino condenado que passa final de semana em casa!? Qual é a lógica disso?
Hoje posso dizer que sou parte das estatísticas da violência em São Paulo. E, se você ainda não tem um assalto para chamar de seu, não se preocupe: a sua hora vai chegar.
Desculpem o desabafo, mas, hoje amanheci um cidadão envergonhado de ser paulistano, um brasileiro humilhado por um calibre 38 e um homem que correu o risco de não ver os seus
filhos crescerem por causa de um relógio.



É... realmente, quando uma "otoridade" no assunto se manifesta devemos acolher a sua opinião. Certo?



Nao, errado. Muito errado, aliás. Acolher o dito por Luciano, o HUCK, é o mesmo que dar crédito a tantos outros personagens televisivos que, a título de doutores, não sabem mais da realidade social que o seu pseudo-cientista-escritor. Veja a Hebe e os seus comentários sob pena de morte... É, uma gracinha realmente...



A criminalidade é uma realidade. A polícia, infelizmente, não vai diminuir o índice de criminalidade. Essa é outra verdade. TAmpouco mais prisões ou sistemas muito rígidos. Basta ver, por isso, o sistema norte-americano, que é o mais grave, com penas mais recrudecidas e, mesmo assim, não conseguiu diminuir a sua criminalidade, mantendo-o em nível similar ao nosso (depois, com tempo, postarei aqui uma estatística realizada por um americano, muito interessante por sinal).



Será que O HUCK acha que a criminalidade vai diminuir mantendo os "assassinos condenados", como ele chama, presos o dia inteiro? Bom, eu e um monte de gente, que estuda a sério o assunto, cremos que não. Houve, inclusive, um Estado de nova-iorque que tentou essa abordagem, no passado, e não foi muito feliz.



Agora, o principal é que O HUCK esqueceu que vivemos em uma democracia. Democracia possui um preço. E o preço é aceitar as diferenças. Isso não se resume a colocar popozudas no palco ou a colocar músicas de baixo teor na mídia. Não é isso.



O preço da democracia é aceitar que determinadas pessoas, porque são livres, cometam crimes. Esse é um preço que pagamos, pois temos liberdade de ação, expressão, comportamento. Por isso, dois jovens podem assaltar alguém. E, da mesma forma, alguém pode escolher viver de forma maldosa, pois ela é livre pra escolher o seu modo de agir.



Isso não quer dizer, contudo, que não haja repressões. O direito penal existe para defender determinados bens em conflitos com outros. Ou seja, se o Azinho quis assaltar o Bezinho, ele irá responder por roubo qualificado por uso de arma de fogo. E, uma coisa que O HUCK esquece, é que o crime é um só. Se alguém não paga imposto, deveria ser penalizado penalmente, da mesma forma que alguém que rouba (mas a crimonologia crítica, ao falar desses criminosos de colarinho branco, mostra a sua não punição).



Vejamos no que dará o assalto dele. Talvez os criminosos sejam presos. Talvez não, porque a cifra negra da criminalidade é muito grande. Mas, espero sinceramente, que ele, O HUCK, não decida sobre o futuro dos jovens... acho que, na sua visão de mundo, retirar um relógio de 46 mil reais, de alguém com patrimônio de milhões de reais, mereceria pena de morte.



Será?





Fonte: http://maisvoce.globo.com/mensagem.jsp?id=16556

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